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Imagem/Facebook Ivan Valente |
Por Saiure Ribeiro*
Para quem ainda tinha dúvidas sobre o estado de barbárie no qual o Brasil se encontra, domingo, 16 de agosto de 2020, todas elas foram sanadas. Uma criança de apenas 10 anos, natural do Espírito Santo, foi estuprada pelo companheiro da tia, e, após dar entrada no Hospital Estadual Roberto Silvares, em São Mateus (a 218 km de Vitória), dia 08 de agosto, foi constatado que ela estava grávida.
Desde então houve uma luta jurídica para que ela tivesse seu direito de abortar garantido, já que o artigo 128 do Código Penal, garante que a gravidez pode ser interrompida se resulta de estupro. A justiça do Espírito Santo autorizou a realização do procedimento na última sexta (14), no entanto, o Hospital Universitário Cassiano Antônio Morais se recusou a fazer o procedimento e a menina precisou viajar para outro estado para ter seu direito garantindo.
Como se não bastasse ter sua infância roubada, ter que passar por todo esse estresse, a criança de apenas 10 anos, repito, apenas 10 anos, teve seu nome e endereço expostos por Sara Winter, um ser nefasto que tenta a todo custo emplacar nas graças da extrema-direita (que, diga-se de passagem, se contenta com qualquer coisa). O resultado foi o mais desprezível, nojento e absurdo que poderia ser.
Um grupo de fanáticos e fundamentalistas religiosos e odiosos foram parar em frente ao hospital no qual a criança realizava o procedimento, em Recife-PE, e aos gritos chamavam o médico responsável de “aborteiro” e “assassino”, assim como gritavam que a menina era uma “assassina”; além de tentarem invadir o hospital. A cena desses canalhas de joelho, “rezando”, me causou náusea. Ela é o retrato de como o Brasil se tornou inóspito e o mal está cada vez mais escancarado.
Em momentos como esse me pergunto: aonde foi parar a sanidade, o bom senso e o tão aclamado dito de Jesus sobre amar ao próximo? A barbárie se tornou regra. A fé cega e fundamentalista baseada no ódio e no rancor tomou o lugar da compaixão e do amor (se é que algum dia esses fundamentalistas souberam o que é isso). Aqui, a discussão vai além de ser a favor ou contra a legalização do aborto; estamos falando de uma criança que foi estuprada, que teve que ouvir aos 10 anos de idade que a culpa era dela por estar grávida e que iria para o inferno se ousasse abortar.
Eles, cujo lema é “Deus, Pátria e Família”, que em nome da “inocência das crianças” digitaram 17 na última eleição, para que não chegassem nelas o “kit gay” e a “mamadeira de piroca”, esqueceram de observar além dos seus umbigos. Em nome de “Deus” culpabilizaram uma criança; em nome da família queriam obrigá-la a parir o infortúnio de um estupro. Esse é o Brasil terrivelmente evangélico que Damares profetizou.
Ainda há esperança, graças a Deus – não esse que eles dizem acreditar, mas o Deus da Justiça, da Fraternidade e do Amor. A menina conseguiu terminar o procedimento e se encontra bem.
Depois desse domingo, das cenas inescrupulosas que vi e ouvi, tive a certeza de que sendo o inferno ou o céu o lugar para onde vou após a morte, espero ficar bem longe deles.
* Graduanda em História pela Universidade de Pernambuco.
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