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Da Redação.

Qual a parte que te cabe do latifúndio desta tragédia e o que fazer para iniciar uma caminhada em busca de sua superação?

A pandemia causada pelo novo coronavírus escancarou ainda mais as mazelas da já “adoecida” sociedade brasileira. Todo o processo que antecedeu e sucedeu o golpe político-jurídico-midiático de 2016, que mitigou sensivelmente a nossa democracia e culminou com a eleição de Jair Bolsonaro, expôs em raio-x para todo o mundo o Brasil, antes aspirante a nação promissora, como uma republiqueta de fragilidade preocupante. 

Perda de direitos, desidratação na economia, desorientação na educação, saúde necessitando de aparelhos e população sentindo na pele os sintomas. O resumo do diagnóstico se apresentava. 

No entanto, desde o anúncio do primeiro caso de covid-19 no país, o que se viu até aqui, fundamentalmente na figura do presidente, foi um show de ineficiência, irresponsabilidade, desumanidade, de falta de empatia e de uma série de ações necessárias para se combater a pior crise sanitária e de saúde do planeta nos últimos cem anos. 

Com uma sanha genocida, Bolsonaro chamou o vírus de “gripezinha”, debochou do número de mortos, provocou aglomeração, descumpriu orientações de autoridades de saúde, questionou dados, receitou remédio comprovadamente ineficaz, provocou mais aglomerações, negou a gravidade da doença e, inacreditavelmente, passados cinco meses da pandemia, mais de três milhões de pessoas infectadas e após a dolorosa marca de mais de cem mil mortes, a natureza negacionista e inepta persiste e as incertezas em relação ao futuro do país só aumentam. 

Assistimos estarrecidos a esse cenário de horror e nos questionamos até quando o país o suportará. Mas, se não mais o suportamos, a questão que se coloca é: como sair dessa situação, que sem sombra de dúvidas entrará para a história como sendo um dos momentos mais tristes pelo qual o Brasil já passou?

Não nos resta mais dúvidas que o bolsonarismo é mais um legado da nossa elite do atraso. Infelizmente, acreditamos que ele é maior que o próprio Bolsonaro e, por isso, sobreviverá ao atual presidente. Dito isso, derrotar o bolsonarismo não significa apenas apear do poder o seu principal representante neste momento. Precisaremos fazer desmoronar os pilares que o sustentam. 

Esses pilares começaram a ser construídos depois que a elite do atraso se deu conta da dificuldade que seria a sua volta ao poder. A partir daí sua estratégia para a retomada do poder converteu-se em criar, junto à população, um cenário de desalento, ódio e ressentimento. Para isso, o velho discurso do combate à corrupção veio muito bem a calhar.  Há quem diga que a construção desse cenário começou a ser feita durante o julgamento do mensalão em 2012; em seguida, tivemos as manifestações de 2013, iniciada com a justa reivindicação do MPL (Movimento do Passe Livre) contra o aumento da tarifa do transporte público na cidade de São Paulo, mas que foram cooptadas pela mídia golpista brasileira, que conseguiu fazer dessas manifestações uma ofensiva popular contra os governos do PT, acusados de terem sido os responsáveis pela sistematização da corrupção no Brasil. 

Aí veio a operação Lava Jato em 2014, apontando seus canhões em direção, sobretudo, a pessoas ligadas ao Partido dos Trabalhadores e às empresas brasileiras que conheceram um crescimento extraordinário durante as gestões petistas. Apesar dos ventos totalmente desfavoráveis, o PT consegue sua quarta vitória presidencial sucessiva com Dilma Rousseff, derrotando o candidato tucano Aécio Neves, que não reconheceu sua derrota. Ele questionou o resultado das eleições de 2014, abrindo caminho para o golpe travestido de impeachment de 2016.

O discurso na época do golpe era que, caindo a presidenta Dilma, a economia brasileira voltaria a crescer. Veio o governo golpista de Michel Temer e nada de retomada do crescimento; pelo contrário, além das intermináveis acusações de corrupção (o vaticínio de Dilma Rousseff parecia se confirmar: nenhum moralista sem moral irá sobreviver), tivemos a aprovação da PEC 55, que congelou investimentos públicos por 20 anos, e da Reforma Trabalhista, que flexibilizou as leis trabalhistas, penalizando os trabalhadores. O governo Temer era um tremendo desastre.

Diante de toda essa situação, as pesquisas de intenção de voto para as eleições de 2018 apontavam o favoritismo do petista Luiz Inácio Lula da Silva, lembrado pela maior parte da população brasileira como o melhor presidente que o Brasil já teve. Ora, não fazia sentido nenhum golpear o PT em 2016 para vê-lo voltar ao poder em 2018: o golpe não fecharia. Dessa forma, a operação Lava Jato, em conluio com setores do judiciário e com a grande mídia brasileira, encarregou-se de julgar e prender Lula.

Sem Lula como principal adversário, Bolsonaro venceu as eleições de 2018. Essa vitória só foi possível graças ao erguimento de dois pilares: o ódio e o ressentimento ao PT e às esquerdas e a rede de fake news, fartamente utilizada pela campanha do candidato da extrema-direita fascistoide. Assim, acreditamos que derrotar o bolsonarismo significa derrubar esses dois pilares. Para isso, é de fundamental importância a produção e divulgação de conteúdos que valorizem princípios inerentes à democracia, como, por exemplo, o compromisso com a verdade factual, o diálogo, o respeito às diferenças, a liberdade e a vida. Por fim, cabem às esquerdas e aos progressist@s a formação de uma unidade estratégica e programática em torno da defesa desses e de outros princípios democráticos.