Imagem/Brasil Escola

Por Saiure Ribeiro*

O 20 de novembro é considerado o dia da Consciência Negra aqui no Brasil. A data cunhada em 1970 pelo poeta gaúcho Oliveira Silveira, fundador do grupo Palmares, surgiu como uma maneira de comemorar “o valor da comunidade negra e sua fundamental contribuição ao país”. O grupo liderado por Oliveira Silveira, nos anos 70, discutia sobre qual o melhor dia para essa comemoração. No entendimento do movimento, o dia 13 de maio não representava a legitimidade da luta dos povos negros. Sendo escolhido o dia 20 de novembro, data da morte de Zumbi de Palmares.

Zumbi dos Palmares foi um dos maiores líderes da resistência negra durante o período de escravidão; ele foi morto violentamente, tendo suas mãos cortadas e a cabeça decepada em 20 de novembro de 1695, após caçada promovida pelo governador da Capitania de Pernambuco, Caetano de Melo e Castro. Durante o período escravista do Brasil, que durou 388 anos, um importante marco de resistência negra foram os quilombos. Um dos maiores quilombos que temos conhecimento foi o de Palmares, localizado hoje em Alagoas. Há indícios, segundo historiadores, que em 1670 o local abrigava cerca de 20 mil pessoas e Zumbi liderou o Quilombo de Palmares, acolhendo e protegendo a cultura negra.

Hoje, dia 20 de novembro de 2020, 325 anos depois da morte de Zumbi dos Palmares e 50 anos da primeira comemoração do Dia da Consciência Negra, ainda há pessoas negras sendo assassinadas de maneira violenta por serem negras. Como é o caso de João Alberto Silveira Freitas, um homem de 40 anos que foi espancado até a morte no estabelecimento da Carrefour em Porto Alegre. Beto, como era chamado pelos amigos e familiares, depois de um desentendimento no caixa do supermercado, foi levado por dois seguranças ao estacionamento, um deles era PM temporário que estava afastado. Lá, ambos começaram a bater em Beto, imobilizando-o e pressionando seu corpo sobre o chão. Além dos seguranças, havia mais uma funcionária do estabelecimento acompanhando o caso e nada fez. A SAMU foi acionada, mas Beto não resistiu e morreu, ou melhor, foi morto.

O que dói mais diante desse acontecido é que ele não será o último, assim como não foi o primeiro. A cada 100 brasileiros assassinados, 75 são pessoas negras. A cada 23 minutos uma pessoa negra é morta no Brasil. O Atlas da Violência de 2018 constatou que o assassinato de negros aumentou 11,5% em dez anos e de não negros caiu 12,9% no mesmo período. Os dados são assustadores, mas reais.

Beto vai ser mais um nome relembrado pelo povo negro, mas esquecido por todo o resto da sociedade. Como é o nome de Agatha Vitória, criança de 8 anos morta por bala perdida, que sempre tem como alvo a pele preta; assim como aconteceu com o adolescente de 14 anos, João Pedro, morto no Rio de Janeiro. Ou quem sabe, num engano de 80 tiros que atingiu o pai de família, o músico Evaldo Rosa de 46 anos. E o Miguel, que tinha apenas 5 anos e foi mais uma vítima fatal do racismo presente na sociedade brasileira.

E para aqueles que vêm com o papo de “consciências humanas”, que “são os próprios negros que são racistas”, que “deveria todo mundo esquecer esse papo de negro x branco” e que “negros são vitimistas”, eu peço encarecidamente: CALEM A BOCA!

Estão nos matando todos os dias! Estão nos humilhando todos os dias! Estão nos marginalizando todos os dias! Pois nascer negro/negra no Brasil é ter na pele um alvo, que se não mata, maltrata, escraviza e tortura.  A luta do povo preto relembrada hoje foi construída por meio de muito sangue, de muitos nomes, de muitos sonhos e de pessoas que durante sua vida lutaram para mudar essa realidade. Ainda hoje batalhamos, mas não deveria ser tão difícil.

Desde Zumbi até o Beto, a carne mais barata do mercado é a carne negra!

Mas o meu Povo Preto luta e resiste!

Sabemos da dificuldade, do risco e de como a história foi forjada para nos oprimir, mas deixo aqui a frase de Conceição Evaristo como mantra para continuarmos a lutar:

“Eles combinaram de nos matar. E nós combinamos de não morrer”.


* Graduanda em História pela Universidade de Pernambuco.