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Diversos e Livres
Por Ivânia Freitas*
"Não é a consciência do homem que lhe determina o ser, mas, ao contrário, o seu ser social que lhe determina a consciência". Karl Marx
Desde que
iniciamos o quadro de quarentena, não faltaram proposições de como “ocupar” o
tempo que pareceu grande, largo, extenso demais, para não se fazer algo
“produtivo”. Como diria o professor Giovani Alves (2011), o capitalismo nos
capturou a subjetividade e passamos a acreditar que só somos úteis, se
estivermos “produzindo” (para sua lógica) 24 horas. Ou apresentamos algum
“produto”, ou não somos nada. Ou “produzimos” ou não seremos notados, ficaremos
deprimidos, enlouquecidos diante do ócio obrigatório.
Nessa
fenda temporal onde fomos obrigados a desacelerar, os conglomerados das
tecnologias passaram a abrir sites e aplicativos pagos, para acesso do grande
público, iniciando uma corrida (insana) para ocupar a mente com o “rico”
conteúdo que os capitalistas decidiram disponibilizar aos mortais trabalhadores
que pareciam ter tempo livre demais, para não fazerem nada (de útil).
O ócio
(forçado) nos mostrou que, parte de nós, já está devidamente adaptada ao
aligeiramento da vida, a superexploração cotidiana das relações de trabalho, e
mais, que estamos perdendo a capacidade de viver as relações mais íntimas. Pelo
que parece, aquele discurso que denunciava como ruim, o fato de não termos
tempo para dialogar com os filhos, irmãos, pais, esposa, esposo, não era um
problema, de fato, mas uma rota de fuga ou, um jeito de viver, ao qual nos adequamos
e aprendemos a gostar.
Falar via
mensagem de WhastApp parece ser menos constrangedor do que o contato dos
corpos, das vozes, da presença sentida e confrontada no trânsito da casa, entre
os quartos, nos encontros das refeições, que passaram a ser coletivas. Toda
essa inversão que tomou conta do dia a dia de forma repentina, juntando com a
tensão da ameaça ainda assustadora do poder do vírus global, serve para nos chamar
a atenção sobre o que estamos nos tornando.
No
cenário estarrecedor e revelador da acelerada desumanização que vivemos, não
faltam proposições para que a vida se precarize ainda mais. Na lógica de não
parar a “produtividade”, as instituições de ensino passam a discutir como
continuar com as tarefas diárias, para “minimizar” os prejuízos do tempo
(indeterminado) que teremos que enfrentar. No contexto pandêmico, as
tecnologias digitais ganharam evidência e abriu-se a temporada das atividades
remotas para não deixar parar a “produção”.
Na
educação, essa imposição do ensino à distância não aparece apenas agora no
estado de quarentena ao qual fomos submetidos, mas é uma possibilidade que já
vem nos ameaçando há dias. Ou seja, está na pauta do governo federal há um bom
tempo. Por isso, devemos olhar com cuidado e precaução para este cenário,
tendo em vista as medidas governamentais em curso e como elas têm nos levado a
níveis estranguladores da educação pública.
O
contexto nos mostra que há uma grave desvalorização das instituições públicas
de ensino (como mostram os cortes de recursos) e um alinhamento, no mínimo
intrigante, do governo com as empresas que têm a educação como um “serviço”,
principalmente, as instituições de ensino superior privadas, fundações e o
grande empresariado que defendem duas teses básicas: a) o Estado é ineficiente
no serviço público e b) o estado deve ser enxuto, sendo a educação e a saúde,
áreas de altos gastos.
Como solução para estas afirmações, os empresários apresentam uma proposta que resolveria estes dois grandes obstáculos: a privatização. Para avançar nesse intuito, é preciso desqualificar estes setores, desprezando o conhecimento científico e a produção acadêmica; criando laços ideológicos entre escolas, universidades e partidos políticos; disseminando inverdades conceituais, teóricas e históricas; estabelecendo rankings a partir de indicadores descontextualizados da realidade concreta dos países e instituições e desmoralizando os professores.
Nesse
último aspecto, a desmoralização vem tanto por via da precarização das
condições de trabalho, como e principalmente, da banalização do ensino, do
papel do professor nesse processo. É nesse ponto, que devemos dedicar atenção
para compreender, com clareza, esse movimento que se aproveita da pandemia,
para avançar sorrateiramente sobre as instituições. A emergência do momento
pode nos custar caro no futuro e por isso convoco a todos os professores e
professoras, a ficarem atentos e atentas ao que está por vir.
Mesmo que
tenhamos a boa intenção de achar uma saída temporária para não atrasar as
atividades escolares e acadêmicas proporcionando atividades com uso das TIC,
isso pode virar um forte argumento para justificar a transformação do ensino
superior em ensino à distância, já que, sob a perspectiva do Estado a serviço
do capital privado, (como é o caso do Estado Brasileiro), o processo formativo
não interessa e sim, os resultados imediatos que as estatísticas podem
evidenciar com precisão.
Como essa conversa é longa, continuamos esse debate na semana que vem. Até lá!
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