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Diversos e Livres

Por Ivânia Freitas*

A conversa de hoje é uma provocação a partir de uma crônica escrita pelo Professor Dr. Átila de Menezes Lima da UNIVASF, Campus Senhor do Bonfim.

Depois que a pandemia da COVID-19 refez o curso da nossa vida, temos experimentado situações cotidianas que nos colocaram em estado de asfixia. Vivemos cansados, confusos e insatisfeitos com quase tudo. A incerteza de até quando essa situação irá durar tem gerado uma sobrecarga mental maior do que podemos suportar. Junta-se a isso o excesso de trabalho remoto que nos colocou 24 horas diante de telas, cujos efeitos, principalmente na saúde, serão o maior legado dessa superexposição.

O trabalho remoto transformou nossas rotinas ampliando o processo e as formas de exploração dos trabalhadores que agora arcam sozinhos com a responsabilidade de desenvolverem suas tarefas de dentro de suas casas que viraram locais permanente de trabalho. Toda essa invasão no cotidiano tem efeitos imediatos como o descontentamento com as atividades desenvolvidas, o que vai implicar diretamente na sua qualidade.

Isso ocorre não por conta da falta de comprometimento de cada um com seu trabalho, mas por conta das condições sob as quais esse trabalho se desenvolve. Dentro de nossas casas, as atividades são ininterruptas, uma vez que, no contexto pandêmico, todas as tarefas estão concentradas em nós mesmos, gerando um quantitativo grande de atribuições.

Quando tudo isso se soma às atribuições profissionais que se misturam nesse complexo universo da casa e se junta a todos que nela habitam, os efeitos são inúmeros. O maior deles é a ausência de um ambiente favorável ao necessário descanso. Não podemos esquecer que já estamos com mais de um ano de pandemia e a maior parte de nós, ao menos, tem buscado seguir as recomendações dos organismos de saúde internacionais de ficar em casa, quando possível.

Desse modo, sem termos condições de estar em outros ambientes que ajudem na quebra da tão exaustiva rotina, a casa, que sempre foi o lugar para onde voltávamos do trabalho em busca de sossego e descanso, virou símbolo de exaustão. Na crônica denúncia do Professor Átila, podemos ver a descrição exata desse cenário na vida de um professor que, sem dúvidas, reflete o nosso cotidiano.

Os dias se tornaram “remotos”...

São dias estranhos e esvaziantes...

Vivo constantemente angustiado...

Com uma ânsia enorme de morte-vida...

Sufocado existencialmente...

“Minha moradia” já não é mais prazerosa...

Ela já não é lugar de descanso, realização e lazer...

Já não tenho mais intimidade em “minha própria casa”...

Ela se tornou ambiente de negação e não-realização da vida...

A dimensão do trabalho alienado ocupou todos os espaços...

Já não tenho mais descanso aos sábados, domingos e feriados...

Existe uma aceleração brutal das atividades que não consigo “ver o tempo passar”...

Sinto-me sufocado, sem liberdade em meu “próprio lar”...

Aulas síncronas, assíncronas, reuniões administrativas, “lives”, eventos, grupos de estudos, demandas administrativas, e-mails, etc...

Por todas as partes da casa tem demanda laboral ou algo que lembre...

E a questão vai bem além de uma boa organização do meu dia a dia...

Vidas on-line, hiperatividade, captura das subjetividades, quadros depressivos...

Os algoritmos controlam meu cotidiano e o de milhões de seres humanos...

O “controle remoto” de nossas vidas aumenta assustadoramente, controle de nossa subjetividade para aumento da produtividade, tudo se “transforma em capital”...

Da subsunção formal a subsunção real, o capitalismo vem conseguindo a subsunção-subordinação total de nossas vidas à lógica do capital...

(Vivendo remotamente, Átila de Menezes Lima, março de 2021)




* Doutora em Educação e Professora da UNEB - Campus VII.