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No
Brasil, os números mais atualizados mostram que 78% dos mortos pelas polícias são negros. Importante destacar que onze Estados não informaram a raça das
vítimas, o que dificulta a formulação de políticas públicas voltadas para o
combate ao racismo.
As desigualdades de raça são evidentes também no mercado de trabalho. Enquanto que entre a
população branca o desemprego atingiu a marca de 8,7% no ano de 2019 e 11,5% em
2020, entre os pretos esses números foram, respectivamente, 13,5% e 17,2%.
Por fim,
com relação aos índices de pobreza, os números revelam que antes da pandemia
33% das mulheres negras estavam abaixo da linha da pobreza; em 2021, já são
38%. Os números são muito parecidos entre os homens negros. Na população
branca, os números ficaram assim: de 15% antes da pandemia para 19% em 2021. Já
a extrema-pobreza atingia 9,2% das mulheres negras em 2019, subindo para 12,3%
neste ano de 2021. “Para os homens brancos, essa taxa foi de 3,4% para 5,5%
nesse mesmo intervalo”. De fato, os negros correspondem a 75% dos pobres do
país, enquanto que os brancos estão entre os 70% mais ricos. Ver aqui.
Esses
dados mostram que o racismo é uma verdade factual no Brasil. Assim, “a conexão
entre a miséria e a origem racial é tão definitiva no País que programas de transferência
de renda destinados a eliminar a extrema pobreza só poderiam fazê-lo ao
beneficiar os negros, mesmo sem adotarem políticas afirmativas de raça”. É a
conclusão a que chegou o jornalista Miguel Martins em matéria escrita no ano de 2014. Naquele ano, 73% dos cadastrados no Bolsa Família eram pretos e pardos
autodeclarados. Em relação ao Brasil Caridoso, os números alcançavam 77%. 80%
dos beneficiados com os programas Luz para Todos e o Fomento às Atividades
Produtivas eram negros. Esse número alcançava a marca de 92% no caso do Bolsa
Verde. Dessa forma, no país, os programas sociais são, de certa forma,
políticas afirmativas. Portanto, o processo de desmonte deles, ocorrido a
partir do golpe de 2016 e intensificado no atual governo de Bolsonaro, poderá
aprofundar, ainda mais, das desigualdades raciais no Brasil.
Ademais,
esses números asseguram que no Brasil não há uma democracia racial e que as
desigualdades sociais não são devido a tão somente às diferenças de classe como
defendia Gilberto Freyre. Ao autor do livro clássico “Casa Grande e Senzala” é
atribuída descrição do idílico cenário da democracia racial brasileira.
Acontece que os dados daquela época, década de 1930, já revelavam, de maneira
irretocável, a precária situação dos negros no país; é o que mostra Emília
Viotti da Costa no capítulo “O mito da democracia racial no Brasil” de “Da
Monarquia à República: momentos decisivos”, um livro que é um clássico da
historiografia brasileira e que é a dica de leitura da Aroeira para esta
semana. Nele, a autora constrói sua argumentação a fim de responder ao seguinte
questionamento: “como um poderoso mito, a ideia de democracia racial – que
regulou as percepções e até certo ponto as próprias vidas dos brasileiros da
geração de Freyre – tornou-se para a nova geração de cientistas sociais um arruinado
e desacreditado mito?”
Segundo
ela, “a chave para a compreensão do padrão racial, do processo de formalização
do mito e de sua crítica pode ser encontrada no sistema de clientela e
patronagem e no seu desmoronamento”. Assim, para Viotti, “com a derrocada do
sistema de clientela e patronagem e com o desenvolvimento de uma sistema
competitivo, tornava-se mais difícil para negros e brancos evitar situações em
que o preconceito e a discriminação tornar-se-iam visíveis. Se a manifestação
de preconceito era basicamente incompatível com o velho sistema de clientela e
patronagem, numa sociedade competitiva ela transformava-se num instrumento
natural usado pelos brancos contra os negros. Os brancos tornaram-se mais conscientes
de suas atitudes preconceituosas [...] Os próprios negros constataram, quando
tiveram que competir por empregos e posições no mercado de trabalho, sem o
amparo de um patrão branco, que estavam submetidos à discriminação”.
Texto que nos ajuda a compreender esse mito que distorce a nossa percepção da realidade,
dificultando a realização de ações concretas que visam a superação do racismo
entre nós. Fica a dica!
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