Imagem/Rodrigo Alberto Toledo

Semana passada o IBGE divulgou o IPCA, mostrando que a inflação, no ano de 2021, ficou em 10,06%, maior índice em seis anos. O grupo de transportes teve o maior peso, devido aos constantes aumentos no preço dos combustíveis. No mês de setembro do ano passado, Bolsonaro culpou o PT, que não governa o país desde de 2016, pelos sucessivos aumentos. Segundo ele, “quem arrebentou com a Petrobrás foi o PT”.

Essa afirmação do “excrementíssimo” senhor presidente nos permite pensar a associação entre o estabelecimento da atual política de preços da Petrobrás, o golpe de 2016 e como processos sociais que ocorrem fora das fronteiras dos Estados territoriais interferem na vida nacional, obriga-nos a repensar o modo como discutirmos justiça social neste mundo globalizado. Essa discussão é importante sobretudo neste ano de 2022, quando haverá, no Brasil, eleições para a escolha do novo presidente e dos futuros parlamentares.

O golpe, travestido de impeachment, que derrubou a presidenta Dilma foi uma manobra parlamentar, com o apoio de vários setores da classe dominante brasileira, bem como sua tropa de choque, a classe média conservadora, sob o olhar complacente, para não dizer conivente, de membros do poder judiciário brasileiro. No entanto, processos e disputas externas também pressionaram para que houvesse o golpe. Destaca-se, por exemplo, a implantação de uma agenda neoliberal, que dificilmente conseguiria conquistar mentes e corações nos marcos de um processo eleitoral dentro da normalidade. Evidentemente que o imperialismo não pode ser subestimado. Na verdade, neoliberalismo e imperialismo são fenômenos que se associam.   

Após a consolidação do golpe, a Petrobrás, durante a gestão do golpista Michel Temer, anunciou a mudança na sua política de preços, que passou a ser norteada pelo preço do petróleo no mercado internacional e pelas variações na cotação do dólar – tudo isso para assegurar os lucros dos acionistas e facilitar o processo de privatização da empresa (ver aqui).

Além de provocar a mudança da política de preços da Petrobrás, a sanha neoliberal impôs também a Reforma Trabalhista, que fragilizou as leis trabalhistas e reduziu o poder dos sindicatos, a PEC do Teto dos Gastos, que limitará investimentos em programas sociais, saúde e na educação por vinte longos anos em favor da acumulação de recursos para pagar juros da dívida pública aos acionistas, e a Reforma da Previdência, que retirou direitos de mais de 100 milhões de brasileiros.

Todas essas mudanças bloqueiam a promoção da justiça social. Elas também demonstram que as discussões e a luta por justiça, neste mundo globalizado, não podem ficar reduzidas ao espaço interno dos Estados territoriais; pelo contrário, “graças à elevada preocupação com a globalização e às instabilidades geopolíticas pós-Guerra Fria, muitos observam que os processos sociais que moldam suas vidas rotineiramente transbordam as fronteiras territoriais”, como afirma Nacy Fraser no artigo “Reenquadrando a justiça em um mundo globalizado”, a dica de leitura da Aroeira para esta semana.

Fraser é taxativa ao dizer que as teorias da justiça devem ser tridimensionais, abarcando as dimensões política, econômica e cultural da justiça, ou seja, precisam articular as demandas por redistribuição socioeconômica e reconhecimento legal e cultural com as lutas pela ampliação dos espaços de representação política comum. Ademais, ela defende a tese de que essas disputas exigem a construção de um novo enquadramento, não mais o “Keynesiano-Westfaliano” (que reduzia as disputas ao interior dos Estados territoriais) e sim um modelo pós-Westfaliano, que cria as condições para a promoção de uma justiça verdadeiramente democrática (que atende as três dimensões da justiça), em que os sujeitos empenhados na luta pela promoção da justiça se articulam não apenas em nível nacional, mas também internacional. Fica a dica!